terça-feira, 6 de novembro de 2012

De favela a parque, o visual maravilhoso do alto da Catacumba


Passei toda minha infância e adolescência no Rio de Janeiro. Quando meu pai me levava de carro ao colégio, passávamos pela Lagoa Rodrigo de Freitas, um dos pontos centrais da zona sul. Lembro-me da favela que existia perto do Corte do Cantagalo. Armando, que conhecia bem a História carioca, dizia que a favela se chamava Catacumba pois os indígenas, antes da chegada dos portugueses, enterravam seus mortos na encosta do morro. Eu imaginava, no meio dos casebres, catacumbas como a dos primeiros cristãos, com sepulturas escavadas na terra; confesso que o local emanava, para mim, uma aura arrepiante.
Alguns anos depois, em 1970, o governador Negrão de Lima decidiu remover os habitantes das três favelas contíguas da Catacumba – uma delas se chamava Maranhão, certamente lembrando a primeira família de nordestinos que tomou o espaço por volta de 1942. As 10 mil pessoas foram transferidas, mais à força do que por vontade própria – vivíamos o auge da ditadura militar –, para conjuntos habitacionais na zona oeste, como Cidade de Deus e Vila Kennedy. Ganhavam uma casa nova de concreto, mas perdiam a proximidade do trabalho – e, de quebra, uma das mais belas vistas do Rio.
Em 1979, para impedir que o lugar pudesse ser retomado por habitações irregulares, a encosta entre o Morro do Sacopã e o Morro dos Cabritos foi transformada em área ambiental. Depois de algumas trocas de nomes, os 30 hectares de mata chamam-se hoje Parque Natural Municipal da Catacumba.
O parque da Catacumba hospeda espécies como a Heliconia pendula, nativa da América Central e da Amazônia.
Na primeira metade da encosta, o parque ganhou muretas, caminhos, pontes e praças. Uma coleção de 30 esculturas formou um museu ao ar livre. As que foram criadas com material de qualidade sobreviveram às intempéries; outras estão corroídas pela ferrugem. Combinando cultura e natureza, o lugar tornou-se um recanto de lazer para o carioca e para o turista.
Escadarias, bancos e praças cortam a parte baixa do parque da Catacumba.

Em 2010, uma empresa de turismo de aventura foi autorizada a prestar serviços dentro do parque
. Um quiosque com teto de palha foi construído perto da entrada, o que provocou ira de alguns montanhistas. A empresa acabou ganhando a simpatia de outros jovens que queriam praticar arvorismo e várias trilhas suspensas foram criadas.
Gabriel Afonso mora na Tijuca e veio ao parque pela primeira vez para caminhar sobre cabos entre as árvores.
Sua prima Ilana, quando se dá conta da altura e do balanço no cabo, fecha os olhos e range os dentes.
Como meu objetivo na Catacumba é caminhar na mata, decido continuar a subir. Na segunda metade da encosta, a “urbanização” do parque, com suas ruas empedradas, desaparece e dá lugar a caminhos de terra. Duas trilhas bem sinalizadas levam ao ponto culminante, situado a 130 m de altitude.

A subida ao topo do Morro do Sacopã é leve e rápida. Passo por uma escadaria em ruínas, certamente alguma lembrança de um beco da favela. As trilhas de hoje seguem os caminhos que existiam há cinco décadas.

As árvores ainda são jovens. O esforço de reflorestamento começou apenas em 1988 com a plantação de espécies pioneiras, de crescimento rápido, para evitar deslizamentos de terra. Na década seguinte, espécies como ipês e paineiras foram introduzidas.
Chego a uma encruzilhada. O caminho da esquerda vai para o mirante do Sacopã, o da direita à Pedra do Urubu. Decido ir em frente pois meus olhos conseguem vislumbrar um monte de flores amarelas.É um ipê que está do outro lado da encosta, já na vertente que tem vista para o Corcovado. Entro no mato em busca da foto.
O ipê amarelo me dá as boas-vindas ao topo do morro, com uma vista singular do Cristo do Corcovado.
Um casal também chega no topo da trilha, ambos usando simples sandálias havaianas; a subida não demanda equipamento sofisticado.
Volto ao caminho principal e sei que minha recompensa, neste dia claro sem nuvens, será espetacular. Do alto do Morro do Sacopã, as vistas são fabulosas. Tenho a Lagoa Rodrigo de Freitas aos meus pés, com a Pedra da Gávea, os Dois Irmãos e os bairros do Leblon e de Ipanema se esparramando na minha frente. As possibilidades de fotos são tantas!
Ando algumas dezenas de metros até o outro mirante. O nome Pedra do Urubu é merecido. Vejo centenas de pontos negros flutuando no céu. Deste lado, os ângulos são diferentes. Abaixo do Corcovado, vejo os bairros da Lagoa e do Humaitá. Dou meia volta e tenho todo o Morro dos Cabritos (que tem a forma de um seio feminino) e o do Cantagalo.

Do Morro do Sacopã, a parte central de Ipanema e, no oceano, as ilhas Cagarra (esquerda), Redonda (fundo), Comprida e Palmas (direita).
Da Pedra do Urubu, vista do Corcovado, da entrada do Túnel Rebouças e do Humaitá.
O Morro dos Cabritos (esquerda) e o do Cantagalo (fundo) e a margem da Lagoa.

Mesmo parecendo clichê, minha câmera celebra as vistas maravilhosas desta cidade!

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