A duas semanas das eleições americanas, a disputa entre o presidente Barack Obama e o rival republicano Mitt Romney volta ao que mais interessa ao eleitor: economia, empregos e redução do déficit público. O embate cara a cara terminou na noite desta segunda-feira (22), na Flórida, com o último dos três debates presidenciais. Diante do tema, política externa, era até previsível que Obama demonstrasse mais segurança que seu oponente. Afinal, ele tinha alguns trunfos a apresentar. Osama Bin Laden foi morto em seu governo, a guerra no Iraque está formalmente encerrada e a retirada do Afeganistão está a caminho. Romney bem que tentou enfatizar a ideia de que os Estados Unidos de hoje são vistos com fraqueza por quem deles esperava força – e cobrou do presidente um tratamento mais duro em relação às ambições nucleares do Irã de Mahmoud Ahmadinejad. Ainda assim, as pesquisas pós-debate com os telespectadores deram uma vitória tranquila de Obama – 48% a 40% pela CNN e 53% a 23%, segundo a CBS. Não foi para tanto, até porque o peso da vantagem do presidente no duelo da Flórida é diminuído pelo grau de interesse do eleitor em assuntos externos.
Segundo pesquisa do Instituto Gallup divulgada pouco antes do debate, apenas 4% dos americanos veem o foco no exterior como a questão mais importante das eleições. Outros 3% consideram as guerras no Iraque e no Afeganistão. Esses porcentuais os colocam como assuntos marginais diante do que está no topo das preocupações. A “economia em geral” lidera com 37%, seguida pelo desemprego, com 26%. Depois aparece o déficit público, com 12%. Não por acaso, tanto Obama quanto Romney fizeram de tudo para enxertar esses assuntos no debate, repisando o que disseram nos dois encontros anteriores. Foram 25 minutos de discussão não-relacionada à política externa, um tempo considerável num debate de 90 minutos. Em um certo momento, os candidatos se estenderam tanto na questão da utilidade de contratar mais professores para fazer a economia crescer que o mediador, Bob Schieffer, pediu: “Vamos voltar à política externa”. Não adiantou muito, pois logo à frente eles tornaram a falar de redução de déficit, corte de impostos, índice de desemprego e competitividade.
Romney ao menos tentou associar questões domésticas às externas. Disse que o déficit crescente torna a imagem dos EUA mais frágil no exterior. E usou a mesma ideia da fraqueza para justificar seu plano de aumentar em US$ 2 trilhões os gastos com as Forças Armadas. O candidato republicano disse a Obama que a Marinha tem seu menor número de embarcações desde 1917. A comparação é imprecisa, pois naquela época eram contados barcos que hoje nem mais fazem parte da frota. Evidentemente, muita coisa mudou em armamento naval ao longo de quase 100 anos. Bem-humorado, Obama não perdeu a chance de responder com sarcamo à longínqua referência de Romney: "Também temos menos cavalos e baionetas, pois a natureza das nossas Forças Armadas mudou." O interesse de Romney em falar de investimentos na Marinha parece ter um alvo específico: o Estado da Virgínia, na Costa Leste. Lá ficam os principais estaleiros do país, de onde saem os porta-aviões americanos, e a base naval de Norfolk é a maior do mundo. A Virgínia é um dos Estados-pêndulo, aqueles em que a disputa está indefinida (as pesquisas apontam empate em 48%), e dará ao vencedor 13 votos no Colégio Eleitoral. Falar a favor de mais dinheiro para a Marinha pode ser decisivo ali.
Aos telespectadores, enfim, ficou a impressão de que os candidatos não queriam perder muito tempo com temas sobre os quais o eleitorado não se importa muito. Por isso mesmo, o melhor desempenho de Obama neste debate não deve mudar muita coisa no cenário das pesquisas, que delineia uma disputa acirrada.
Eleitores americanos à parte, o encontro foi útil para o público do resto do mundo saber como cada um pretende lidar com os temas mais preocupantes da política mundial. Sobre a Síria, nenhum dos dois trabalha com a ideia de usar tropas americanas em uma intervenção militar (em tempos de retirada no Iraque e Afeganistão, isso pegaria mal) e preferem reforçar a parceria com a oposição ao ditador Bashar al-Assad. Romney, que tem a simpatia do premiê israelense Benjamin Netanyahu (ao contrário de Obama), foi mais incisivo na defesa ao aliado do Oriente Médio: “A tensão entre EUA e Israel é lamentável”. Contudo, esquivou-se da pergunta sobre o que faria se Netanyahu lhe telefonasse dizendo que iria bombardear o Irã: “Não vamos entrar em situações hipotéticas”. A grande distinção entre os dois ocorreu quando Bob Schieffer lhes perguntou qual era a grande ameaça à segurança nacional no futuro. Para Obama, “as redes de terrorismo”. Segundo Romney, “o Irã nuclear”. Cada um puxou para seu lado mais conveniente. O presidente quer manter a ideia de que os americanos precisam continuar à caça dos terroristas e que a morte de Bin Laden não eliminou o problema. Romney, por sua vez, insiste no Irã por ser o assunto mais candente em Israel e pelo fato de Obama ter conduzido a questão em banho-maria até agora. No mais, ao público brasileiro chamou a atenção o fato de Romney ter destacado a América Latina como um mercado em que os EUA podem aumentar suas relações comerciais em detrimento da China – contra quem, na visão dele, Washington está travando (e perdendo) uma guerra silenciosa na área comercial.
Em suas considerações finais, Obama disse que agora seguem muitos comerciais de TV para as duas campanhas até o dia 6 de novembro. A corrida pela Casa Branca volta a se focar no que vai mesmo decidir a disputa: economia. Oriente Médio, China, América Latina e todo o resto do mundo aguardam sua vez de voltar à pauta quando o novo (ou o mesmo) presidente dos EUA for conhecido.
Revista Época
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