Grecianny Carvalho Cordeiro*
Na época de escola, os
clássicos da literatura nacional possuem um sabor diferente, quase amargo,
talvez pelo simples fato de se constituírem em leitura obrigatória. No entanto,
quando relidos a posteriori, na
maturidade, de forma espontânea, esses livros passam a ter um sabor doce,
propiciando uma dimensão nova e fabulosa em nossa vida. Machado de Assis, José
de Alencar, Raquel de Queiroz, Graciliano Ramos, Érico Veríssimo, Jorge
Amado... são autores cujas obras transcendem o tempo, daí porque são
considerados clássicos.
Mais recentemente, ao me
deparar com a leitura de Moacyr Scliar, no seu romance “Manual da Paixão
Solitária”, descobri um livro para ser devorado imediatamente, inteligente,
interessante, empolgante e também emocionante.
Uma mesma história, um mesmo
livro, contado em diferentes visões, por dois professores, especialistas em
estudos bíblicos, os quais contam a história relatada no Gênesis, de Judá e da
mulher Tamar.
A bela Tamar se casa com Er,
o filho mais velho de Judá, o qual vive uma profunda crise existencial,
relacionada à sua duvidosa virilidade e a sua tendência homossexual. Er morre e
o irmão Onan se casa com Tamar, por quem nutre confusos sentimentos de ódio e
amor.
Shelá, o filho mais novo de
Judá, nutre uma paixão solitária por Tamar, acreditando que um dia será o seu
esposo natural, em virtude do falecimento dos irmãos, até que uma reviravolta
acontece. Por Tamar, Shelá vive constantemente a se masturbar, acreditando ser
o inventor da masturbação.
Tamar não consegue
engravidar, tal como reza a tradição, e se vê obrigada a traçar um plano
espetacular para vingar as humilhações sofridas pelo sogro, do qual vem a ter
um filho.
Moacyr Scliar consegue
adaptar um enredo bíblico a uma história extremamente atual, inclusive,
abordando assuntos considerados “tabu” – naquela época – e mesmo hoje, ainda
não tratados de forma tão aberta, como a homossexualidade e a masturbação. Tudo
isso numa linguagem direta sem ser jocosa, muito pelo contrário, até poética.
Moacyr Scliar se foi, mas
deixou uma obra literária maravilhosa, a qual se encarregou de torná-lo
imortal.
*Promotora de Justiça
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