A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) autorizou, ao menos nos últimos cinco anos, reajustes para os planos de saúde individuais acima da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) – considerada a inflação “oficial” do país.
O reajuste que passou a valer em maio de 2012 (que leva em conta em seu cálculo a inflação do ano anterior), por exemplo, foi de 7,93%, acima dos 6,50% de inflação em 2011. No ano passado, a agência autorizou aumento de 7,69%, contra uma inflação de 5,91% em 2010.
Segundo a ANS, o cálculo do reajuste autorizado leva em consideração “a variação da frequência de utilização de serviços, a incorporação de novas tecnologias e a variação dos custos de saúde”. A agência aponta ainda que a renda média dos trabalhadores no país vem crescendo nos últimos anos acima dos índices de reajuste autorizados por ela.
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O reajuste da ANS vale apenas para planos médico-hospitalares individuais contratados a partir de 1º de janeiro de 1999 – e, em 2012, atingiu cerca de 8 milhões de pessoas, o que equivale a 17% dos beneficiários de planos de saúde no país. Os planos coletivos são negociados livremente entre as empresas e as operadoras.
De acordo com a ANS, entre dezembro de 2008 e março de 2012 o número de beneficiários de planos de saúde no país passou de 40,9 milhões para 47,8 milhões – uma alta de cerca de 17%.
Com o aumento do número de beneficiários – e apesar da alta de preços – os planos de saúde são alvo constante de reclamações. Na terça-feira (2), a ANS anunciou a suspensão da venda de 301 planos de saúde, de 38 operadoras, por descumprimento de prazos estabelecidos para atendimento médico, realização de exames e internações. Desses, 223 são reincidentes.
Foi a segunda vez que a agência divulgou este tipo de punição – a primeira foi em julho e atingiu 268 planos. A ANS atribui o aumento no número de planos suspensos à alta nas reclamações feitas pelos usuários, que foi de 4.600 para 10,1 mil no período.
Ano* | Inflação | Reajuste autorizado pela ANS |
---|---|---|
2007 | 4,46% | 5,48% |
2008 | 5,90% | 6,76% |
2009 | 4,31% | 6,73% |
2010 | 5,91% | 7,69% |
2011 | 6,50% | 7,93% |
*Ano da inflação, referência para o reajuste do plano de saúde no ano seguinte |
Só em 2013
Há menos de duas semanas, a fotógrafa Patrícia Sartori, de 35 anos, telefonou para nove médicos endocrinologistas que atendem na zona norte de São Paulo – região da cidade em que ela vive e trabalha – para marcar uma consulta, mas ouviu como resposta que todos estão sem horário até o ano que vem.
“Decidi marcar a consulta mesmo assim, mas, para ajudar, eles ainda não têm agenda aberta para 2013”, diz. “Me sugeriram ficar na fila de espera de desistência. Quando perguntei quantas pessoas havia na minha frente a secretária respondeu: ‘tenho até medo de te falar’. Diante disso, desisti.”
Cliente da Unimed Paulistana, a fotógrafa procurou a central de atendimento da operadora e ouviu como resposta que deveria buscar um médico em outra região da capital paulista.
“Consigo marcar médico lá no fim do mundo. Para quem trabalha de segunda-feira a sábado e tem filhos pequenos é muito complicado”, desabafa.
Patrícia conta que, em resposta a uma reclamação sua publicada no site Reclame Aqui, a Unimed afirmou que a resolução da ANS não determina local nem horário de consulta, apenas prazo.
“Vou esperar chegar mais perto do fim do ano e tentar marcar uma consulta. Se fosse algo urgente, acho que eu teria que ir a um médico particular, faria um empréstimo no banco para pagar a consulta e depois processaria”, diz. “A continuar deste jeito, acho que daqui a pouco o SUS vai estar melhor.”
Cancelado
Depois de ter as marcações de consultas em três especialidades médicas negadas ou agendadas só para três meses depois, o empresário Daniel Mansur resolveu cancelar seu plano de saúde e não tomou coragem para contratar outro. “Estou preocupado em comprar outro e ficar sem atendimento de novo. É um produto tão caro, ainda mais para duas pessoas com mais de 50 anos como eu e minha mulher, então estou esperando as coisas se aclamarem no sistema de saúde”, diz.
Daniel, de 54 anos, e a esposa não conseguiram consultas em cardiologistas, ortopedistas e dermatologistas por um plano da operadora Greenline. “Quando perguntavam qual era meu plano e eu dizia Greenline, eles diziam que não tinham horário ou que tinham só para daqui a três meses”, conta Daniel. Diante da falta de atendimento, ele e a esposa resolveram cancelar o serviço há cerca de sete meses.
Para Daniel, as operadoras de plano de saúde, bem como de outros serviços como o de telefonia, enfrentam problemas no país por não estarem sendo capazes de absorver a demanda crescente de novos usuários. “Isso acontece com planos de tudo, elas fazem propaganda, conseguem cliente depois não dão conta de atender. Se colocassem o dinheiro da publicidade para se estruturar antes de receber os clientes, o atendimento melhoraria”, diz.
Distância
A auxiliar de atendimento Fabiana Aparecida dos Santos, de 27 anos, gastou R$ 450 em três exames de ultrassom apesar de ter o plano Original, da Unimed Paulistana, porque não conseguiu atendimento perto da sua casa. Apesar de ter diversas clínicas listadas no guia de serviços da operadora com o serviço disponível na região em que mora, na prática não encontrava atendimento. “Eu ligava e nenhuma atendia meu plano. Só podia fazer em uma, muito longe da minha casa”, diz.
Ela acabou indo apenas uma vez na clínica distante e pagou os três ultrassons seguintes do próprio bolso. Em contato com o serviço de atendimento da Unimed Paulistana, perguntou por que não era atendida nos outros locais listados e pediu a atualização dos endereços. O prazo para receber a resposta foi de cinco dias. A filha Isis nasceu e ela diz que até hoje não conseguiu a informação.
O que dizem as operadoras
Procurada pelo G1, a Unimed Paulistana informou que Fabiana Aparecida Silva Barros entrou em contato com a Central de Atendimento em 4 de maio solicitando a listagem da rede credenciada e local para a realização de exame ultrassom morfológico para a categoria de seu plano. Na ocasião, a cliente disse que tentou realizar o exame no laboratório Nasa, porém ele não atende a categoria de seu plano. Indicamos outros laboratórios e a cliente disse que não precisava mais, pois já havia agendado em outro local.
“No dia 7 de maio, a cliente voltou a entrar em contato com nossa Central de Atendimento solicitando novamente a listagem com locais para o exame de ultrassom morfológico. Indicamos o Centro de Procedimentos e Apoio (CPA) Zona Leste, um serviço próprio da Cooperativa e que fica localizado na mesma região em que reside a cliente. Na data de hoje, dia 03/10, a cliente voltou a entrar em contato com nossa Central solicitando autorização para consulta para seu filho e a mesma foi autorizada”, diz a operadora.
No caso de Patrícia Sartori, a empresa informou que a cliente entrou em contato com a Central de Atendimento no dia 21/09, requerendo o agendamento com um médico endocrinologista.
“Solicitou de preferência na Zona Norte, porém foi informada na ocasião de que o agendamento deve ser disponibilizado dentro do prazo estipulado pela ANS, mas não no local de preferência do cliente. Nesta mesma data foi agendada a consulta para a cliente, no dia 24/09, em um consultório na Bela Vista, porém a cliente dispensou. Ainda no dia 24/09, a cliente registrou Reclamação no Site “Reclame Aqui”, onde foi contatada pela Ouvidoria da Unimed Paulistana, informando que não concorda com a consulta em outra região, devido ao horário de trabalho e a rotina diária de pegar os filhos na escola”.
“Ressaltamos que o agendamento ocorre de acordo com a Resolução da ANS (RN 259 / 268) a qual determina que o agendamento seja feito dentro de um determinado prazo, mas não na localidade, data e horário de preferência do beneficiário”.
O G1 procurou a Greenline, que não se manifestou até a publicação desta reportagem.
G1
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