segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Fortaleza dos diversos símbolos

A Praça do Ferreira é considerada, por muitos fortalezenses, como um dos ícones da cidade, mas há outras opiniões

"Como é realmente a cidade sob esse carregado invólucro de símbolos, o que contém e o que esconde...". Fortaleza é assim, exatamente como indaga Ítalo Calvino no trecho de "As Cidades Invisíveis". Não existe um único símbolo que a represente, diferentemente de como acontece com outros locais do mundo.

Praça do Ferreira, Theatro José de Alencar, Ponte dos Ingleses, Forte de N. Senhora de Assunção, Farol do Mucuripe e Centro Dragão do Mar são elementos simbólicos de Fortaleza fotos: Kid Junior, alex costa, Rodrigo carvalho, Natasha mota e Waleska Santiago

Fortaleza tem vários elementos que lembram a sua história e são significativos para a cidade, como o Theatro José de Alencar, o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, a Ponte dos Ingleses e outros. No entanto, isso acaba dificultando a formação de uma identidade própria. Na opinião do professor da Universidade de Fortaleza (Unifor) e membro da Academia Cearense de Letras, Batista de Lima, vivemos em um lugar sem identidade.

"Até os anos de 1940, vimos a Belle Époque (influência francesa). Depois veio a interferência inglesa. Portanto, os símbolos mudam e estão ligados a uma época", explica. O membro da ACL pontua que a falta de uma simbologia própria é prejudicial à cultura do Município. A população se confunde na hora de apontar o símbolo da Capital.

Prova disso é que o pôster, que divulga Fortaleza como uma das sedes da Copa do Mundo de 2014, traz nove elementos como representantes da cidade.

O brasão do Município, presente na bandeira, traz o Forte Nossa Senhora de Assunção que, junto com o hino, forma o conjunto de símbolos oficiais. Já a personagem Iracema, do romance homônimo do escritor cearense José de Alencar, traz elementos que remontam ao surgimento do povo do Ceará e à geografia de Fortaleza, daí ter se tornado ícone cultural da localidade, por meio de lei municipal.

A Praça do Ferreira, que abriga a Coluna da Hora, foi considerada ícone da cidade pelo concurso "Eleja Fortaleza", promovido pelo Sistema Verdes Mares, em 2001. De fato, o logradouro tem uma importância muito grande para os fortalezenses. Uma pesquisa feita pelo Diário do Nordeste revelou que metade dos entrevistados acredita ser o equipamento o mais representativo para a Capital. Para eles, a praça é o local que abriga as pessoas.

Segundo a professora da Unifor, Erotilde Honório, que dirigiu o documentário "Flertando com a Praça", historicamente, o logradouro funcionava como um centro de negociação, onde aconteciam as trocas comerciais. Também era lugar de sociabilidade. "É como se a praça fosse uma extensão do quintal de cada um, servindo de espaço de conversas, troca de ideias e veículo de mediação dos diálogos. Só a presença das pessoas confere ao local o título de coração da cidade", esclarece.

A coordenadora do Patrimônio Histórico da Secretaria de Cultura de Fortaleza (Secultfor) e arquiteta, Márcia Sampaio, afirma que Fortaleza tem multiplicidade. "É uma cidade viva, onde estão sempre surgindo novos símbolos", aponta. Para ela, é a afetividade que faz com que elementos se tornem ícones. "O símbolo vai tratar da presença da comunidade junto ao bem".

Na tentativa de criar um elemento único para Fortaleza, o Governo do Estado do Ceará tem um projeto para a construção de um Centro de Convenções de entretenimento e cultural, na Praia Mansa, que servirá de símbolo arquitetônico.

Mas, para Augusto César Paiva, membro do Instituto de Arquitetos do Brasil, Departamento Ceará (IAB-CE), depois que a elite criou a ideologia de que a cidade tem uma forte vocação para o turismo, a necessidade de criação de um símbolo tem se tornado imposta. "A criação de qualquer ícone, sem legitimação pelo processo histórico, está fortemente fadada ao fracasso. O símbolo poderá se tornar um elemento sem representatividade na memória de seu povo. A memória, essa sim, é o elemento chave para a construção de símbolos", conclui.

História com simbolismos, mas sem conhecimento

Com tantos símbolos, a memória não permeia o imaginário dos fortalezenses. Falta conhecimento histórico. A população, às vezes, até tem contato com elementos do patrimônio municipal, mas não sabe o que eles representam para a cidade.

Fortaleza já tem os seus símbolos, como afirma o membro do Instituto de Arquitetos do Brasil, Departamento Ceará (IAB-CE), Augusto César Paiva, alguns já descobertos e outros a serem descobertos. "Dentre os desvendados, podemos citar: o Theatro José de Alencar, a Praça do Ferreira, a Praia de Iracema, o Estádio Presidente Vargas, o Bairro do Benfica", contabiliza.

Já a arquitetura do Centro da Cidade, escondida por trás das placas, dos postes e das fiações, poderá tornar-se símbolo de Fortaleza, por exemplo. Augusto César Paiva comenta que não somente a arquitetura pode tornar-se símbolo de uma cidade; a música, a escultura e a natureza também podem. Os símbolos não necessariamente são arquitetônicos, porém, devem ser históricos.

Divulgação

A Coordenação do Patrimônio Histórico da Secretaria de Cultura de Fortaleza (Secultfor) revela que trabalha com a divulgação dos equipamentos e com o tombamento como forma de preservá-los. "Lançamos uma cartilha voltada para a educação patrimonial e um guia cultura de bolso, informando todos os equipamentos e programações culturais que a cidade dispõe", lista a coordenadora Márcia Sampaio.

Além disso, junto com a Secretaria Municipal de Educação, a Secultfor realiza feiras de livros didáticos com a história de Fortaleza e com explicações sobre o tombamento, com intuito de divulgar a importância da ação para o bens culturais.

Márcia considera a atual gestão como a que mais investiu na cultura e na história. "Fizemos várias adequações na lei, criamos o Conselho de Patrimônio Histórico, que define os bens a serem tombados, e já tornamos 44 equipamentos protegidos". No total, são 53 bens tombados, sendo 19 por meio de decreto, além de dois reconhecidos enquanto Patrimônio Imaterial.

OPINIÃO DO ESPECIALISTA

Cidade: fruto da multiplicidade de vozes e culturas
Erick Assis - Historiador e professor da Uece

Uma cidade é fruto de uma multiplicidade de vozes. Ela é polifônica por excelência. A literatura moderna sobre a urbanização já reconhece isso há muito tempo. E por que isso ocorre? Bem, tem política no meio desse fenômeno. As cidades ganham identificação histórica com um ícone a partir de uma disputa de valores estéticos, culturais, religiosos, econômicos, políticos. Enfim, no fim, quem tiver mais força política de barganhar junto ao poder público e/ou privado ganha o predomínio de uma imagem a ser homenageada. Eu quero dizer com isso que nada é a toa em relação à criação de símbolos que representem a "cara" de uma cidade.

Nós ouvimos falar de que Fortaleza não tem um ícone específico. Na minha opinião, o mar tem uma vocação natural para ser um símbolo dessa cidade. A coluna da Hora, nos anos 1930, tinha importância, ficou até bem pouco tempo sendo uma referência. O que faz um monumento ser ícone são várias injunções conjugadas. Os interesses de grupos, indivíduos, do Estado e da iniciativa privada, tudo isso depende da relação de forças que se estabelece para fazer realçar determinado tipo de legado da memória.

O que garante a predominância de um ícone se reflete, em boa medida, na formação histórica de um povo. Não tenho a menor dúvida de que a maioria dos fortalezenses tem debilidade em sua formação histórica. Aqui não se tem uma cultura histórica consolidada, fazemos um turismo piegas. Nossas escolas, na sua maioria, estudam História do Ceará e de Fortaleza como algo secundário.

ENQUETE

O que pode representar a Capital?

Escolheria o Theatro José de Alencar como ícone de Fortaleza por sua história e por receber o nome do escritor cearense. Acho que a Cidade deveria ter somente um símbolo que a representasse.

Ana Lídia Costa
Estudante

Acredito que o Dragão do Mar seja o equipamento mais representativo de Fortaleza. Trata-se do point cultural da Cidade, onde estão reunidos vários elementos de arte, cultura e lazer. Também tem significação arquitetônica.

Andreza pereira
Estudante

Para mim, a jangada é o que melhor representa Fortaleza. É uma coisa antiga que lembra os pescadores e o Mucuripe, bairro de tradição da cidade. Acho que Fortaleza deveria ter apenas um símbolo.

Pedro simãoPorteiro

LINA MOSCOSOREPÓRTER 

Diário do Nordeste

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